sexta-feira, dezembro 24, 2004

Véspera

Parece-me. Sem dúvida. A minha mão penetra um amontoado de neve. O gelo queima proporcionando uma dor insustentável. Persisto, contrariando todos os mecanismos físicos que batalham, desesperadamente, para retomar a pré-definida homeostasia. Calmamente, perco a sensibilidade ao frio, ao passo que os meus neurónios sensitivos perdem a capacidade de conduzir impulsos eléctricos. O sangue, agora mais viscoso, flúi, desesperado, pelos labirintos da condução. Já não existe agora a sensibilidade. Mesmo assim, existe algo, semelhante a uma sensação de vazio, como se algo que sempre existiu tivesse desaparecido. Atinge-se o inevitável. A mão morre. Corto-a e deixo-a ficar. Enquanto o gelo durar, ela não apodrecerá. Ficará ali guardada no espaço-tempo.
Hoje é dia de consoada. O Natal é estranho. No fundo é só um dia como os outros, mas, as pressões da sociedade, transformaram-no num dia bizarro. Uns defendem que é altura de ser solidário e dar aos outros o que se puder. Outros defendem que é um dia especial, que se passa com a família, quentes, felizes e em paz, no maior dos confortos e comodidades, em torno de quantidades industriais de comida. Há aqueles que decidem transformar o ambiente que o vai rodear em algo de surreal, fantástico. Esmeram-se numa decoração excêntrica de dourados, prateados, vermelhos e verdes, como se tivessem subido para outro nível do mundo. Há também os que passam completamente indiferentes à época e os que a passam a trabalhar, servindo a sociedade. Há os que passam o natal no hospital sozinhos. Há os solteiros que os passam em casa, rodeados de luxo mas, mesmo assim, insatisfeitos com a solidão. Há ainda pessoas que odeiam o natal, devido a problemas passados associados como frustrações de infância, morte de parentes, deficiências económicas ou mesmo revolta dentro desta época. Mas, em regra, o nosso natal é passado em casa, com a família, pinheiro a brilhar, mulheres na cozinha em azáfama preparando doces e refeições, homens petiscando e reunidos em grupo, a ver televisão ou a discutir assuntos indiscutíveis como o futebol ou a política, pensando que alguma entidade superior os vai ouvir e seguir as suas ideias, ou que estão a revelar alguma teoria genial da salvação das economias do país. As crianças correm pela casa ansiosas pelas prendas. São elas as mais felizes com o natal. A lareira hoje funciona ao máximo. Há um sorrisinho estranho na cara de todos. No fundo o Natal cria felicidade. Aproxima-se a hora. Enviam-se as mensagens e realizam-se as últimas chamadas de feliz Natal. Janta-se. Come-se o possível e o impossível. Ainda faltam as sobremesas. A quantidade de álcool no sangue nos homens, já subiu consideravelmente e em associação com o calor, ruboriza rostos. As mulheres, coitadas, ainda mal acabaram de cozinhar e servir as refeições e já tem que levantar tudo da mesa. Comem apressadamente a sobremesa para irem arrumar a cozinha. Os homens entretanto entram no álcool pesado. Fumo percorre-lhes o labirinto da respiração. Diminui-lhes as expectativas de repetir muitas vezes o momento, mas, a ideia é ignorada em conformismo e comodidade. As crianças parecem ter guardado todas as energias para aquele dia. Gastam o chão num alvoroço. Os homens vão terminando a sessão de esgrima com o palito. Arrotam, manifestando satisfação. As mulheres terminam os seus afazeres. A família volta a reunir-se em torno da televisão. Voltam as conversas. Alguns entram em cartas ou passeios. O tempo vai passando. Entra-se noutro dia. Empurra-se mais qualquer coisa pela garganta abaixo, mesmo que não tenha espaço e acabe por ficar no esófago. As horas vão passando. Já é madrugada. O sono começa a romper. As crianças começam a perder a euforia e a ficar impacientes. Hora de ir. Amanhã há mais...

13 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

[10:29:19] AntimAteriA novo post :)
[10:29:25] AntimAteriA se depois tiveres tempo pa ler :)
[10:29:33] __ines vou ser sincera
[10:29:35] __ines quando os leio
[10:29:39] __ines fico muito em baixo
[10:29:43] __ines prefiro nao le los
[10:30:35] __ines es muito depressivo quando escreves
[10:30:41] __ines es muito down
[10:30:46] __ines e devias ser o contrario

Ass: __ines

Unromance disse...

Gosto bastante o facto de estar com a minha mae e a minha irma. São poucos os momentos em que a atenção de cada uma se vira para as outras duas.. Não somos o melhor exemplo de familia mas em alturas como esta, em que estamos de ferias e podemos estar as tres juntas, esses momentos tornan-se muito bons. Não sao as prendas, não é a comida (eu até nem como muito.. tou sempre de dieta.. =P) Simplesmente a companhia delas é que faz do Natal uma data especial.
Curtia que nevasse cá em braga.. nao pra deixar la a mão como tu, mas pra fazer bonecos de neve. Para não falar do frioo :) adoro o frio. =)

Bem.. Desejo-te um bom natal.
Muitos bjinhos

Anónimo disse...

Bem.. tudo o que escreves-te é verdade.. mas é msm..
gosto mto da maneira como escreves parece que estamos a viver aquele momento =)
Bem.. dentro dos possiveis espero que tenhas um bom natal.. e que tudo corra bem =)

Jinhus da tua menina .. Lara ****************

Anónimo disse...

Bem desta vez há alguns comentários ao texto.. Andas a causar sensaçao :P
Quanto ao texto acho q te baseias mto na sociedade e subtilmente fazes uma grande critica. A ipocrisia. Ela está presente até nesta época, se for preciso as pessoas só se vêm 1 vez por ano e msm assim fazem d conta q se conhecem super bem.
Cada um devia passar o Natal com quem queria, e nao com quem a sociedade assim "obriga".
Concordo contigo, o Natal só é verdadeiramente Natal para as crianças, elas sim sao felizes e aproveitam a magia q esta época nos devia transmitir.

Espero q tenhas tido um Bom Natal, ontem disseste me q havia novo post mas n tive tmp para o ler e sinceramente nem tinha paciencia porque eu gst d ler com tempo para poder comentar algo d jeito. Ou pelo menos tentar lol

****

Marta

Anónimo disse...

Hipocrisia*


E alem disso acho q utilizas o inicio do texto para falar d algo q n é bem o Natal .. Provavelmente era o teu estado de espirito na altura :P

***

Marta

Anónimo disse...

Inacreditavelmete, vivi as tuas palavras. É pena k as pessoas s reunam tds, abram as prendas e n saibam sentir o significado do natal.
Desejo-te td d bom, Beijinhos!
Katy

Anónimo disse...

pegando nas palavras do ultimo comentario, mas que significado tem o natal? pensar nas criancinhas? reunir a familia e comer até não poder mais? ajudar os menos favorecidos NESSE dia? de facto eu tou contemplado num dos grupos que ele fala, daquelas pessoas que não liga ao natal, pq o destino assim o quis! fico deprimida. o natal como o conhecemos é hipocrita! todo aquele sentimento de ajudar o outro, de amor ao proximo acaba no dia seguinte... o natal vale apenas pela tradição, e em alguns casos conseguir juntar a familia.
quanto ao meu querido amigo, acho que o texto mais ma vez está fantastico.... não tou aqui o analisar psicologicamente como algumas pessoas o fazem.. analisar uma pessoa por um texto? alem disso que ando gostamos, gostamos! e antimateria o que mais gosto em ti, é a tua amizade sincera... um amigo que não tem de impor a sua presença, para sentirmos que podemos confiar nele. vou dar um exemplo, a minha melhor amiga, que conheço desde a infancia, passo meses sem a ver, e quando nos encontramos não há recriminações, nem pedidos de justificção... quando nos encontramos sentimo-nos felizes por estar juntas... porque a nossa amizade é maior que espaço e distancia.
um jinho muito especial para ti!

Anónimo disse...

Sinceramente não me atrevo a considerar hipócritas aqueles que vivem o Natal de alguma das maneiras que aqui descreves. O Natal é, antes de mais, uma festa cristã, embora muitos nem se lembrem disso. Não sou hipócrita quando desejo aos meus amigos que sejam felizes; é uma forma de lhes dizer que gosto deles. Esforço-me por o fazer várias vezes ao ano, mas nesta época dá-me prazer gastar um pouco do meu dinheiro e do meu tempo para lhes oferecer uma coisa que eu sei que eles vão gostar. Este ano acordei um dia e saí de casa com vontade de dizer a alguém "aprecio-a muito". Levei-lhe um pequeno presente e quando lho ofereci os seus olhos encheram-se de lágrimas. Ela sabia que eu não o faria se não viesse de dentro e sei que se sentiu confortada com isso. Que mal tem dizermos aos outros que gostamos deles? Esta é uma época em que todos nos sentimos mais sensiveis e este texto, mais uma vez, mostra a sensibilidade do seu autor... Natal é tudo isto, mas não nos cabe a nós julgar as pessoas, pelo menos eu não me sinto com esse direito. Sei muito bem distinguir o que é verdadeiro do que é mero cumprimento de obrigação. A ti, meu amigo, desejo o mesmo que desejo aos que me são queridos. Vai embrulhado em papel dourado, sim, porque é o mais precioso. Um beijo grande, delicioso como um concentrado de amêndoa...
Ass: Alic

Anónimo disse...

Tenho lido os teus textos, e acho-os fantásticos...pelo simples facto de que, quem os ler lhes pode dar o sentido que vai no intimo de cada um.Este, da ´vespera`foi quase como a obrigação de ter que comemorar a vépera....Também cortei a minha mão,esteve no gelo, á espera que toda esta época passa-se...apenas quis ficar com a companhia do unico filho que tive e que Deus me levou.....Comtinua Edgar, és genial....eu voltarei..mil beijos para ti

Anónimo disse...

Gosto imenso de vir ao teu blog, embora não o comente, deste-me o endereço e guardei-o nos meus favoritos, para poder ler tudo o que escreves, sou apenas mais uma admiradora anónima, continua Edgar :)

Anónimo disse...

Edgar
Onde andas??Escreve para nós,faze-nos falta...
ok!!Eu digo outra vez,para mim os teus textos são genias,fantásticos mesmo.
Agora que tinha aprendido(com a tua paciencia)a deixar comentátios,não apareces??!!!Tá mal!!!Espero que estejas bem.Mil beijos para tiiiiiiiiiii.mart.

Anónimo disse...

já vim cá varias vezes .. e n vejo novo texto :\


*Marta*Nanuka*